"Se toda sociedade é louca, ajustar-se a ela não significa outra coisa do que tornar-se igualmente louco." - Osho

quinta-feira, 12 de julho de 2012

"O controle tá na tua mão e o jogo é pra você"


Férias! Período pra se fugir da rotina, maçante e racional, a qual somos submetidos pelo sistema. Porém, venho à Guaranésia e toda sua tradicionalidade advinda do senso comum me faz pensar... Tudo que eu vivi e criei enquanto criança e jovem foi moldado através da repetição. Alguém fazia algo que era bem visto pela população e então passava a ser certo e exigido para uma boa convivência em comunidade. Perguntava-me, aos 14 anos, na crisma: porra, por que a gente faz isso? Minha família dizia ser necessária pra se casar na igreja [católica], tudo bonitinho, certinho, dentro dos conformes... Na época, aceitei e segui a tradição. Mas não me sentia completo com tanto moralismo girando em mim. Estudava filósofos que buscavam argumentos para negar o cristianismo. Me crismei, comunguei; tornei-me céptico, embasando-me na filosofia na qual eu buscara refúgio e solução para minhas crises adolescentes. Achei também pessoas que partilhavam da mesma perspectiva que eu, e então, tais convicções que foram se instalando em mim criavam força. Cheguei ao ponto de transitar do satanismo ao budismo, com intuito de achar algum sentido para as merdas que eu via acontecerem no mundo. Ambas as filosofias justificavam tais ‘merdas’ como culpa do homem; o satanismo, em seu real sentido, dizia que era uma falta de culto à libido freudiana, criando a solução na idolatria ao ego através de rituais hedonistas, ao passo que o budismo pregava certa privação dos prazeres momentâneos, usando o ‘subconsciente’ para satisfazer nossos desejos ‘fúteis’, enquanto o cristianismo, o qual é forte aqui, dizia ser vontade de algum ente extra-humano e a confissão e comunhão justificavam os erros dos homens, para que assim, pudessem seguir errando e julgando. (todos exemplos mostrados de forma reducionista e simplista, sem querer entrar em questões maiores). Imagina a doidera de um moleque, dos 15 aos 18 anos pensando assim, convivendo com quem também não concordava com o senso comum, medíocre, em que a comunidade se submetia... deixei de ser céptico quando fui pra faculdade. Ganhei uma bolsa pra estudar psicologia em Poços de Caldas, então arrumei uma casa com uns amigos e mudei de Guaranésia pra lá, crente que acharia quem compartilhasse das mesmas ideologias, mas encontrei o mesmo pessoal bitolado e alienado que vivera em minha cidade natal. Questionava-me: será que a influência da banalização da informação, daquela velha razão grega e também do sentimento e controle das experiências diárias pelo homem, vindos do renascimento, vêm da mídia? Pois a mídia invade as casas da população de forma meio que involuntária, mas me lembrei de que antes disso tudo, o que controlava os homens, salvo os bárbaros e seus antecedentes e sem querem prolongar nesta questão sociológica, era a religião. A religião, e o cristianismo em especial no Brasil, foi a detentora de todo o poder divino durante quase toda a civilização, porém, não de forma clara e dedicada à transcendência como em outras tradições, feito o xamanismo, uma das mais antigas seitas conhecidas, cujo objetivo era que, através de um estado alterado de consciência (atingido em rituais através de sons de tambores, chás de raízes e meditação, apenas pelos xamãs ou caciques no Brasil), se entrasse em contato com seres extra-humanos (animais de poder) a fim da cura e produtividade à colheita do período do ritual.
Pensem no período da colonização do Brasil... Os escravos vindos da Europa e da África não podiam praticar seus rituais, tampouco disseminar suas crenças, além da excursão de padres e músicos católicos que vieram de Portugal para encantar os índios nativos, tipo o flautista de Hamelin. Com isso, toda a cultura brasileira, apesar do forte sincretismo religioso que aconteceu com o camdomblé, ficou sucumbida ao moralismo católico, pois querendo ou não, você é lançado num meio no qual, apesar de você ser o agente transformador deste, você não tem o poder de transformação que você almeja. Somos controlados pelo medo do inferno, por um consolo ilusório no futuro, por uma sociedade medíocre que prefere lotar os bares a parar pra pensar na merda que estão fazendo de suas vidas. Esquecemos, assim, de viver o momento, as oportunidades que nos aparecem, e que muitas vezes precisam ser escolhidas a partir de várias possibilidades. Possibilidades das quais ficamos presos e não arriscamos algo novo; talvez pelo receio de perder o ‘conforto’ já adquirido, talvez pela ilusão do conforto pós-morte, talvez, ainda, pela falsa rebeldia que funciona como uma formação reativa à crença de dias melhores ou à fraqueza humana, gerando a ‘vontade de potência’, como diria Nietzsche (um dos filósofos que embasaram minha descrença no período céptico de minha existência); vontade essa que falta na população em geral... Creio que falta conhecimento acerca da capacidade do homem, de seu poder de transcendência, de seu poder de controle do ‘mundo’, do seu mundo, através de um controle da mente. Em diversos períodos de minha vida questionei meu papel no mundo, mesmo que com meus míseros 21 anos não tenha chegado à resposta alguma (e fico feliz por isso). Contudo, acho válida toda indagação sobre o que é comum, tradicional, sobre o que todo mundo faz, o que é moda, o que é normal, o que é regra, o que é lei, o que é fato. O que é normal à gente continua levando o resto da vida, como se fosse certo ver alguém passando fome e se conformar porque o sistema criou um mecanismo em que quem tem capital investe a fim de gerar mais capital, e quem não tem, vende sua força física, anulando seu potencial criativo... Fazendo, assim, girar a máquina que come as criancinhas que não têm oportunidades ;)

“O controle tá na tua mão e o jogo é pra você”

segunda-feira, 9 de abril de 2012

Trabalhar pra comprar, comprar pra viver, viver pra morrer

Entrou calado e sentou
que nem pros lados olhou
acenou pro garçou
e uma pinga tomou

pediu mais uma
pagou a conta
saiu depressa
mas logo volta

cansado do dia
inteiro de trabalho
recebendo ordens
sendo controlado

escape veloz
fugaz solução
beber pra esquecer
esquecer de viver

viver contente
satisfeito e forte
criativo, astuto
sem medo da morte





quarta-feira, 7 de março de 2012

MÉRITO E CULPA


fogo
e com ele a imaginação nasce
fumaça
fazendo a consciencia dormir
olhos vermelhos
também por tanto chorar
luz
apareceu querendo acordar

penso
tentado encontrar solução
esbravejo
achando que vai melhorar
desisto
de nada adianta gritar

televisão
desligo pra não piorar
sozinho
desta vez não vou ficar

rua
bares lotados de mentes vazias
bebida
doce distração pro amargo do dia
relações
escolhem quem voa na a escada da vida
anseio
de ficarem no degrau que hoje você mija

esquecem
que tudo é conquista
batalha
do dia-a-dia
sempre
buscando o melhor
nunca
o outro usar
alertas
devem sempre velar
desprotegidos
que não podem se cuidar
desfavorecidos
numa terra de todos
esquecidos
pelos poderosos
poder
que vêm da ganância
medo
inrustido em tanta pompa e circunstância

terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Pra quem acha que discutir relação resolve, Locke sugere que o estabelecimento de regras e responsabilidades também é importante



       Há muito se sabe que homens e mulheres falam de maneira diferente ao conversar com membros do sexo oposto. Isso nunca foi explicado, mas percepções emergem em conversas de pessoas do mesmo sexo onde, sem a necessidade de acomodar uns aos outros, as diferenças mais profundas entre homens e mulheres prontamente vêm à superfície.
       Em Duels e Duets , John Locke afirma que homens e mulheres modernos falam de maneira diferente porque os nossos antepassados ​​masculinos e femininos seguiram diferentes caminhos evolutivos. Desde que os homens foram selecionados para agredir e dominar, o que poderia levar à muitas mortes, eles precisavam de uma maneira mais segura de alcançar seus objetivos. Duelos ritualizados, usando palavras em vez de armas, encheram o projeto de lei. Duelos verbais também forneceram uma maneira de se exibir as informações que as mulheres precisavam para fazer suas escolhas de longo prazo para acasalamento.
      Em uma série de sociedades tradicionais, os antropólogos encontraram vários concursos, de duelos de canção com tambor, duelos poéticos - tudo lutou com palavras, e todos lutaram por homens. Por si só, isso é intrigante, mas a disposição subjacente ao duelo são também sanguessugas na fala dos homens nas sociedades modernas, mesmo quando eles apenas socializam com seus colegas e amigos. Nestes duelos normais, os homens denigrem os seus amigos de uma forma humorística, muitas vezes, diante de uma platéia, mas eles também têm sessões humorístico-competitivas de narração de histórias em que apresentam talento verbal.
       Hoje, muitos homens se vêem como artistas, buscando eloquência onde poderia atrair a atenção favorável de homens e mulheres, e retratando-se como heróis nas histórias que eles contam. Um advogado de defesa, de forma teatral na sala do tribunal que alguém disse que ele deveria ter sido um ator, respondeu: "O que quer dizer com 'deveria' ter sido? "
       Por razões que Locke descreve no livro, as mulheres tendem a competir com outras mulheres indiretamente, através de amigos em comum, e eles (homens) desenvolveram uma maneira mais harmoniosa de falar para construir seus relacionamentos. Nos duetos, as mulheres criam sentimentos de proximidade através de divulgações íntimas com os outros. Uma forma extraordinariamente pura de dueto ocorre quando as mulheres colaboram, efetivamente na co-autoria e co-contando suas histórias pessoais. [mulherada bandida! rs]
       Alguns livros sobre "a linguagem de gênero" dizem que os meninos aprendem a falar como seu pai, e as meninas imitam suas mães. Mas é claro que homens e mulheres vêm ao mundo "pré-ligados" a se envolver com outros membros do seu sexo de maneiras muito diferentes. O sistema endócrino tem um papel importante aqui, apoiando várias relações entre a voz que fala e a reprodução. Homens que gozam de "pontas" de bloqueio verbal em público também tendem a ter mais testosterona do que outros.
       O valor adaptativo disso é revelado, previsivelmente, no lado de avaliação da equação: as mulheres preferem homens com vozes em tom baixo, especialmente durante a fase de alta fertilidade de seu ciclo menstrual. Neste sentido, as mulheres literalmente chamam a melodia. Mas outras áreas da fala e linguagem também estão envolvidos no namoro. Naturalmente, um dueto tem seu próprio conjunto de suportes fisiológicos. Vocalização íntima tende a aumentar a oxitocina, que parece facilitar a ligação emocional, e diminuir o cortisol, um hormônio do estresse.
       Quão discretas são as relações entre os sexos humanos e quais suas formas preferidas de falar? O autor encontrou muitos casos históricos, onde as mulheres são agredidas verbalmente entre si, e estes ataques eram tipicamente genuínos - apresentados com ira, geralmente como uma forma de represália por uma injustiça - não como uma forma de postura ou relação, e nenhum foi ritualizado. As mulheres podem denegrirem-se, mas não insulte os seus amigos íntimos, mesmo que com humor. Os homens falam em silêncio e em particular com os outros homens, mas eles geralmente evitam o íntimo de auto-revelações que poderiam aumentar a sua vulnerabilidade, e eles raramente trabalham com outros homens em seus esforços para competir com rivais do sexo masculino. Se eles têm algo a dizer a um inimigo ou concorrente, eles geralmente vão até ele e dizem isso.
       Perto do final do livro, Locke revisitou a evolução linguística, sugerindo que, se a linguagem humana é construída da maneira que é porque os designers, os antigos arquitetos humanos, foram construídos a maneira que eles foram, então a forma da linguagem teria sido formada em torno das preferências inatas, roteirizadas e prioritárias. Mas como isso aconteceu? Como é que os modos de relação e interação dos sexos humanos afetam o design da linguagem falada? Em capítulos anteriores o doutor em psicologia cognitiva concentra-se nas coisas que a linguagem, como uma ferramenta de comunicação, tem feito por homens e mulheres; no último capítulo se pergunta o que homens e mulheres fizeram para a linguagem.
       Nos últimos anos, os escritores têm discutido o fato de que as diferenças de língua pode causar confronto em conversas de casaisMas os casais também precisam colaborar na realização de uma ampla gama de operações domésticas, de ficar o carro fixo para criar os filhos, pagar as contas, e manter algum tipo de agenda social. As equipes normalmente funcionam melhor se os membros trazem diferentes forças para a mesa, e dividindo as responsabilidades. Diferentes estratégias de discurso, sugere, podem ajudar os homens e mulheres na malha de suas vidas .

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Tomada da consciência social no pensamento de Sartre

       Antes de mais nada, é preciso diferenciar a humanidade da animalidade, visto que o primeiro é o único que desenvolve, especializa, busca melhorias em suas atividades que não por adaptação ao meio.
Ao passo que os animais agem para satisfazer suas necessidades, os seres humanos agem para produzir os meios de satisfação de suas necessidades conforme afirmaram Marx & Engels. Segundo Jean-Jacques Rosseau, o homem inserido no meio social adquire dentre outras, a capacidade de desenvolver-se mais rapidamente, enobrecer os sentimentos e elevar totalmente sua alma.
       Os seres humanos constroem a história e com isso, aprendem e se desenvolvem. Os animais, muito antes dos homens os denominarem como tais, já construíam suas casas, como o João-de-barro, e ainda hoje suas casas são como eram. Já os homens se desenvolveram e estão sempre em busca de mais. Isto porque possuímos mecanismos e faculdades que nos possibilitaram a criação da cultura e consequentemente, a objetivação de tal cultura com a criação da linguagem. Esta objetivação da cultura humana só acontece a par da apropriação desta pelos indivíduos e é com a apropriação que são projetadas e formadas as aptidões do homem, "ou seja, a apropriação da cultura é o processo mediador entre o processo histórico de formação do gênero humano e o processo de formação de cada indivíduo como um ser humano" (DUARTE, Formação do indivíduo, consciência e alienação, 2004).
Tendo diferenciado o homem do animal, pensemos na atividade e na estrutura de nossa consciência: nos animais, o ato está diretamente relacionado ao motivo de tal ato acontecer; um predador com fome localiza a presa e se comporta estritamente para abatê-la,  ligando fome e presa em um só objeto [indistinção entre objeto e necessidade a ser satisfeita], já no homem, há um mediador entre o motivo do ato e objeto, apontando assim para uma estrutura de atividade mais complexa. Estrutura esta que só se concretiza pelo sentido dado às relações sociais, como afirma Duarte em seu trabalho. Como exemplo usamos uma tribo nômade. Eles sentiam fome como os animais, porém utilizavam técnicas de caça, em que o grupo de caçadores era dividido em dois. A maior parte do grupo se escondia em locais estratégicos, enquanto outros poucos, os batedores, tinham a função de espantar, afugentar a caça para onde estavam esperando o resto do grupo. Esta ação seria sem sentido para os batedores se estes não tivessem consciência de que ao fugirem, os animais estariam caindo na emboscada, tal como seria ao restante do grupo que ficaria apenas "esperando a caça chegar". O que dá sentido a estas ações, é a atividade da caça como um todo, maior e mais complexo.  "O existente, com efeito, não pode se reduzir a uma série finita de manifestações, porque cada uma delas é uma relação com um sujeito em perpétua mudança" (SARTRE, em O Ser e o Nada,  2005, p. 16). O existente seria, nesse caso, toda a atividade de caça, e não poderia ser reduzido à apenas a ação do batedor ou dos emboscadores. Portanto, são as relações sociais que conectam e fazem o meio-campo entre ação e motivo desta ação.
Sartre, em seu pensamento existencialista afirma isto quando mostra que é no encontro entre seres que se dá a identidade e o sentido do Ser (ser-para-si, ser-para-outro, ser-aí-para-outro). Para ele, é pelo olhar que o Ser se forma, transforma e transcende. O Eu é o centro das 'coisas' por ser seu olhar que dá ordem aos elementos existentes no mundo e estes elementos, por sua vez, adquirem relação em si pela ordenação que o Ser faz ao olhar e ainda pela distância do olhar.

"Esta constatação na filosofia sartreana quanto à posição do Eu como “(...) criador das distâncias e das relações entre as coisas” (Biemel, 1985, p. 52) e “(...) centro gravitacional que organiza tudo a partir de si mesmo ” (ibid., p. 50) redimenciona-se em outra: a organização do existente é distinta do estabelecimento da distância com o Outro. Assim, a perda da centralidade é a constatação da existência do Outro, na posição central do meu universo, e elemento de desintegração e de fuga permanente das coisas." (JACOBY; CARLOS, O Eu e o Outro em Jean-Paul Sartre, 2004, p.49) 

     Assim, usando de princípios básicos da fenomenologia (Sartre foi fortemente influenciado pela obra de Husserl), tudo o que aparece, além de ter uma realidade em si mesma, aparece sempre para uma consciência doadora de sentido, como nota-se com o exemplo usado. O batedor, ao ver a presa que espantou se distanciando e percebendo que não conseguiria alcançá-la  (pensando que sua meta final seja saciar a fome) não veria sentido em afugentar os animais que comeria. Do mesmo modo os outros moradores da tribo que acenderiam fogueiras para assar a comida, enquanto os outros caçam, pensariam ser esta uma ação inútil. Mas por poder antecipar as consequências, que os animais vão em direção à armadilha, serão pegos e levados como alimento, o sentido se mostra e sua função recebe significado. Ou seja, a ação (espantar os animais para a armadilha, acender o fogo) tem resultado na atividade (comida para a tribo).
Este é um dos pilares usados por Sartre para defender o jargão "existência precede a essência" por ver o homem, não mais no exclusivo ato de sua definição solitária, mas sim na ação de recolocá-los nas condições exigidas socialmente, questionando o cogito  "penso, logo existo" - existência tal, que, nas palavras do filósofo remete ao "...penso cartesiano, ou seja, ainda, do momento em que o homem se apreende em sua solidão – o que me tornaria incapaz de retornar, em seguida, à solidariedade com os homens que existem fora de mim e que eu não posso alcançar no cogito" (SARTRE, O Existencialismo é um Humanismo, 1987, p. 3).
É a tomada de consciência de que é o outro que retorna a verdade da minha imagem e afirma minha existência que faz 'meu olhar' se voltar para o Eu, questionando minha identidade, tranformando a relação que antes era de sujeito-objeto em objeto-sujeito. Daí o ser-para-outro e a transcendência transcendida, em que para o humanismo existencialista sartreano a transcendência é a superação do Eu  nesse movimento de 'projetar-me' no outro e 'retornar a mim mesmo', entendendo o Eu como em constante construção e eterno vir a ser. "Com isto, o conceito de "transcendência-transcendida" corresponde à própria existência do Outro que confere à minha transcendência um atributo de estar fora de, externa ao Eu. O outro transcende a minha transcendência" (DUARTE, 2004, p. 50) e "a transcendência é estrutura constitutiva da consciência, quer dizer, a consciência nasce tendo por objeto um ser que ela não é"  (SARTRE, 2005, p. 34).
Para Sartre, existem o ser-Em-si e o ser-Para-si, em que no primeiro, é absoluto, não há possibilidades, só afirmações e nele o ser simplismente é. Já o segundo é aquele em que habitam as possibilidades e é este que se abre para a constituição da identidade pessoal.

As frustrações que um modo de vida medíocre pode trazer


Jiddu Krishnamurti
        Em tempos de valores invertidos, saudável é aquele que apresenta leve sinal de insanidade em relação à sociedade. É o que já diziam os filósofos antes da modernidade, do capitalismo, do consumismo e hoje ainda se afirma com o mesmo crédito.
        As relações sociais vêm sendo constituídas a partir da posição, do status, do conforto, do luxo, do poder que o outro pode lhe proporcionar. Vêmo-nos mais do que nunca atrelados à relação sadomasoquista entre sujeito-objeto, porém não mais apenas no sentido filosófico do termo, e sim literalmente. Os meios de produção e o sistema econômico vigente fizeram com que o homem passasse de usuário/sujeito para produto/objeto e os reflexos disso são: individualidade, egoísmo, violência, medo, competição, trabalho, trabalho e mais trabalho. O lazer sempre fica em segundo plano, a criatividade é quase nula. Os homens se aproximam uns dos outros no intuito de levar algum benefício e quase nunca estão dispostos a deixarem algo. Muitas vezes esta busca é por afirmação.
       Devido seguidas frustrações nessas relações com o meio, emerge o fenônemo da depressão, que em 2003 levou cerca de 850 mil pessoas a tirarem suas vidas, segundo pesquisa encomendada pela OMS. As perspectivas são de que até 2020 esta seja a segunda colocada entre as principais doenças de incapacidade para o trabalho no mundo, sendo hoje a quarta, e até 2030 será considerada a maior causa de perdas, tanto no caráter produtivo quanto em custos nos cofres públicos gastos no tratamento para a população entre todos os problemas de saúde. Estima-se que 121 milhões de pessoas no mundo sofram com a depressão - 17 milhões delas somente no Brasil e, 75% dessas pessoas nunca receberam um tratamento adequado, ainda de acordo com a mesma pesquisa. 
       Como não sou fã de estatísticas levanto dois pontos: primeiro, a maioria não tem ciência de estarem encaixadas nesse quadro. Para alguns, os sintomas não causam tanto impacto quanto para outros, assim não têm tantos prejuízos, não procuram ajuda e mantém uma vida digamos "normal". Segundo, nem toda depressão é causada por frustrações com o mundo; de acordo com a teoria de Beck, a depressão age sob a tríade cognitiva em que o pensamento depressivo gira em torno de três aspectos do pensamento:  sobre si mesmo, sobre o mundo e sobre o futuro. Tais pensamentos possuem um tom afetivo negativo tanto na atribuição, quanto na expectativa (ex. "sempre fui assim, nunca vou mudar"), fazendo com que os deprimidos pensem que não têm condições ou direito de responder a estes pensamentos negativos de forma positiva ou adaptativa. E é isso que o sistema precisa! De marionetes estagnadas, mesmo que a custos absurdos de mortes e perdas financeiras.
 Estudos confirmaram que os três elementos da tríade cognitiva não influenciam da mesma forma na depressão de uma pessoa. As visões negativas de si mesmo e do mundo eram mais frequentes em pessoas deprimidas do que as visões negativas do futuro. As visões negativas do futuro são características do pensamento das pessoas suicidas. As pessoas que experimentam uma ira elevada juntamente com a depressão relatam maior visão negativa do mundo. Com isto, constata-se que é de suma importância a compreensão idiossincrática dos pensamentos na tríade cognitiva.
       O mal-estar surge da expectativa e de pensamentos que criamos, e não exatamente de um desconforto real. Na "era das distrações" não percebemos o que acontece a nossa volta. Nossos atos são cada vez mais automatizados, tornando-nos mais e mais inconscientes e irracionais, o que nos faz buscar satisfações ilusórias.
       Há o pre-conceito contra os "Zen" em geral, dizendo serem lentos, adeptos à fuga da realidade. Pois discordo! Praticantes seja de qual for a prática meditativa (mas praticantes de verdade - o que mais se tem notícias é de pseudogurus) criam o hábito do ato consciente, da mente alerta, da consciência disperta e conectada ao todo. Tomam decisões coerentes, justas, rápidas! Têm uma clareza de pensamento impressionante, sem falar da suspensão do julgamento. Mudam o caráter pouco a pouco. Ainda é pouco para receberem um outro olhar? Ok! Estudos realizados na Universidade de Massachusetts (EUA) comprovam alterações físicas no cérebro após um programa de Meditação Para a Redução do Estresse desenvolvido pela própria Universidade. "Os participantes do grupo de meditação passaram, em média, 27 minutos diários praticando. Os exames de ressonância magnética realizados depois do período de oito semanas revelaram um aumento na densidade da massa cinzenta do hipocampo (região cerebral ligada ao aprendizado e à memória) e em estruturas associadas à compaixão e à autopercepção. Os investigadores também constataram que a redução de estresse relatada pelos participantes foi associada à diminuição da densidade da massa cinzenta da amídala cerebral, que exerce um importante papel na ansiedade e estresse." (saiba mais sobre a pesquisa)
       Mas mesmo assim uma pessoa adepta a tal doutrina é vista como preguiçosa, escapista e não recebe o crédito merecido. Reflexos da sociedade de consumo que prioriza o TER ao SER. Haverá o tempo em que os valores voltarão a se inverter. Quem hoje está no conforto da alienação se verá sem sentidos e por não conhecerem outra saída sofrerão sérios problemas.

New Ages como sintoma de uma sociedade doente

Passamos o temido 11/11/11 ( como assim? Tenho 21 anos, passei 01/01/01, 02/02/02, 03/03/03, 04/04/04, 05/05/05, 06/06/06, 07/07/07, 08/08/08, 09/09/09, 10/10/10... e perdi muito tempo digitando isso. Por quê só agora se conspira tanto acerca destas coisas?). 21/12/2012, pode vir quente que eu estou fervendo!

Conspiração aqui, imposição e ataques ali. Eis que surgem os NEW AGEs, inspirados na Nova Ordem Mundial que tenta substituir algumas "verdades imutáveis" por "valores relativos", combatendo o totalitarismo. O impressionante é que não percebem a incoerência básica na questão. Estão sendo impostos um conjunto de medidas para se inserir uma série de regras de como pensar, como agir, o que falar e fazer - ser "politicamente correto". Onde está a relatividade nisso? Cadê a liberdade? Como fica a educação, que poderia gerar meios autônomos para o indivíduo saber o que é certo ou não, bom ou não para sí? O que vem ocorrendo é um "Tratamento Ludovico" camuflado. 
       As grandes corporações, detentoras de um enorme poder sobre a política, economia e mídia, assumem forte influência na sociedade em geral. Pesquisam, vasculham tudo o que acessamos na internet, o que assistimos na TV, os alimentos que mais consumimos e nos bombardeiam com propagandas onde acham que estamos mais vulneráveis: nas redes sociais, onde não se recebe as informações com um senso crítico, mas sim de forma passiva e totalmente sugestionável.
Quem hoje não acessa o Facebook, quem não tem Messenger? Até aí é por mera escolha, temos a opção de não usar tais ferramentas. Mas já ouviram falar de projetos de RGs com chips? Aí é palhaçada! Porque os "poderosos" querem deixar a população chegar a esse nível de controle?
Mero interesse em ser um Mestre de Marionetes.
      De acordo com a filosofia de Marilena Chauí: "A alienação social se exprime numa "teoria" do conhecimento espontânea, formando o senso comum da sociedade. Por seu intermédio, são imaginadas explicações e justificativas para a realidade tal como é diretamente percebida e vivida. Um exemplo desse senso comum aparece no caso da "explicação" da pobreza, em que o pobre é pobre por sua própria culpa (preguiça, ignorância) ou por vontade divina ou por inferioridade natural. Esse senso comum social, na verdade, é o resultado de uma elaboração intelectual sobre a realidade, feita pelos pensadores ou intelectuais da sociedade - sacerdotes, filósofos, cientistas, professores, escritores, jornalistas, artistas -, que descrevem e explicam o mundo a partir do ponto de vista da classe a que pertencem e que é a classe dominante de sua sociedade. Essa elaboração intelectual incorporada pelo senso comum social é a ideologia. Por meio dela, o ponto de vista, as opiniões e as idéias de uma das classes sociais - a dominante e dirigente - tornam-se o ponto de vista e a opinião de todas as classes e de toda a sociedade." (referência da citação)
      Mas se a população se mobilizar, se informar, se armar com todo o poder que o conhecimento proporciona teremos como lutar e acabar com essa falsa democracia que apenas diz proporcionar oportunidades à todos enquanto oprime os podres e fracos, pois como disse sabiamente Ernesto Guevara de la Sierna: os grandes só parecem grandes pois estamos de joelhos.
         O necessário é a espiritualidade, e não os credos e as doutrinas, afirma Leonardo Boff. E isso falta em muito na maioria. Maioria que prega e estampa no peito com orgulho ser mais um desses "certinhos alienados", New Ages, politicamente corretos ou "putas da natureza" - como ouvi certa vez - se assim preferirem rotular. Falta amor à vida. Se não, não estaríamos preocupados com o que acontecerá e nos atentaríamos ao momento, ao que acontece agora. Não viveríamos motivados pela possível libertação futura e sim pela liberdade imediata e constante.

Se em tempos em que quem 'É' é aquele que 'TEM', feliz mesmo é quem deixa de ser!

Hipocrisia! A primazia da técnica influi tanto sobre o sujeito que o homem se anula em função da teoria. Se molda a pessoa afim de encaixá-la em um padrão, muitas vezes, sem sentido para ela. Na vida diária acontece o mesmo quando repetimos padrões culturais enraizados há tempos. Não questionamos o porquê dos rituais, dos costumes, dos medos, das intolerâncias, mas reproduzimos orgulhosamente nosso preconceito irracional de geração em geração. Quem disse que só é verdade aquilo que se vê? Por quê temos que 'parecer' ao invés de 'ser'? Será que temos mesmo que provar algo à alguém? Acho que estamos esquecendo de viver o que vale realmente a pena pra viver o que nos entorpece de imediato; distanciando o homem de sua essência em que é feliz e satisfeito isento de desejos e bens materiais. Segundo Nietzsche, tribos que vivem em condições sub-humanas são ainda mais felizes e realizadas que sociedades capitalistas que criam para si necessidades a serem satisfeitas. Contudo, como a satisfação é ilusória, cria-se um circulo vicioso na busca de cada vez mais recursos e meios para se constituir bens. Contrastanto com o estudo realizado pela revista Forbes que aponta como profissões mais satisfatórias àquelas ligadas ao bem-estar social e religioso (como bombeiros, líderes religiosos, professores, psicólogos e fisioterapeutas) por proporcionarem gratificação pessoal ao verem melhorias na condição humana, vê-se a necessidade do homem se reconhecer como um ser capaz de ser feliz em si próprio, de se perceber como capaz de produzir mudanças em si e no mundo em sua volta. Em estudo sobre consciência política em jovens e a importância da militância em suas vidas, constata-se que ultimamente o jovem perdeu essa consciência de que ele faz parte de um todo e que ele tem um papel fundamental na construção desse todo. Outro fato levantado é o de  que quem busca uma mudança social inserido em um partido político perde seu 'ideal a priori' para seguir a causa ideária do partido em busca de aceitação, alianças e poder. Já militantes que agem em serviços sociais voluntários em busca de tal mudança sentem-se gratificados por terem contato direto com os resultados de seu esforço. Temos então a necessidade de viver em harmonia, sem desigualdades gritantes e sem necessidades de teorias em que se ensina aos homens um método a seguir nem grandes instituições que direcionam o pensar de cada um, que é livre. Temos em nós mesmos as ferramentas! Somos em nós mesmos capazes de ser a mudança, de fazer a melhora - todos sentimos a necessidade de homeostase. Uma pena não percebermos que nossa voz e poder está na mão da política e dos políticos. Assim nos acomodamos, não nos informamos e continuamos no mesmo estado: sem automonia nenhuma!